O caráter e a ação real de Exu

*trecho retirado do livro Exu - O poder organizador do caos, de Norberto Peixoto

Tudo que não é bom, que se afasta de virtudes, se distancia da ação de Exu no campo vibratório dos médiuns. Claro está que essa condição serve para todas as entidades, mas é especialmente válida para os espíritos falangeiros sob a irradiação de Exu. No decorrer de uma encarnação angariamos muitos amigos e inimigos. Entre esses inimigos incluem-se os agentes responsáveis pela dificuldade ou impossibilidade de satisfação de nossas principais necessidades, inclusive alguns dos nossos estados psíquicos internos subconscientes, que se expressam como atavismos comportamentais, agem contra nós, dificultando nossa vida. Ou seja, os inimigos que nos habitam (ansiedade excessiva, insegurança, preguiça, indisposição, indolência, fraquezas de caráter, falta de sinceridade, de responsabilidade, de disciplina, de compromissos, de organização e de ordem mental, entre tantas outras) são agentes dos nossos fracassos. As atitudes e os comportamentos individuais, enquanto expressões do ser, estabelecem os principais fatores para o fortalecimento de um “escudo” de proteção com Exu.




A partir dessas considerações, talvez possamos compreender melhor o alcance da ação de Exu. Ele disponibiliza o axé – força – necessário à destruição desses inimigos, habitantes de nossa interioridade. Em outras palavras, Exu é “inimigo” de nossas fraquezas, atua no nosso lado sombra, trazendo à superfície psíquica, numa espécie de catarse, emoções, sentimentos e atitudes que bloqueiam nosso crescimento interno e a vida no plano físico. Quando identificamos esses inimigos com ajuda de Exu e trabalhamos para que se firme a mudança interna, predominando em nós a vontade de Ogum, nos tornamos gradativamente oferenda viva para os Orixás e falangeiros, companheiros de longas eras, pois nosso mundo psíquico interno fica limpo para recepcioná-los. 

Nesta dinâmica, temos que entender a condição de conselheiros que os médiuns incorporados assumem na Umbanda. A eficácia de quem se dispõe a ser instrumento dos guias e falangeiros, caboclos, pretos velhos e demais espíritos, os aconselhamentos espirituais aos consulentes, isso não inicia nem termina nos transes mediúnicos ou estados superiores de consciência. Se a boca perfumada do conselheiro no dia do aconselhamento no terreiro for fétida no dia a dia, entidades mistificadoras inevitavelmente se infiltrarão em seu tônus áurico, alterando a sintonia e a estrutura medianímica, podendo basicamente acontecer duas coisas:

­1. Espíritos “quiumbas” tomarem frente e se apossarem do Ori – cabeça – do médium, o que infelizmente é mais comum do que se pensa nas “Umbandas”;
2. Não haverá condições para o médium suportar a carga energética demandada nas entrevistas com os diversos consulentes, advindo a fadiga fluídica, a fraqueza, a perda de axé – tônus anímico ou fluido animal – pessoal e bloqueio do fluxo de axé – vibrações – das entidades benfeitoras; o médium pode adoecer.

 As duas situações são preocupantes, mas a segunda é a que mais ocorre. Neste caso, os “quiumbas”, espíritos mistificadores e embusteiros, farão de tudo para proteger e cuidar do seu médium, enquanto ele estiver à mercê de seus poderes e for o caneco e piteira vivos, dando-lhes fluidos vitais para se “alimentarem”. Nesta hipótese – real –, o guardião Exu não consegue “fabricar” o escudo de proteção, pois o médium é falacioso, maldoso, dissimulado, interesseiro, vaidoso... Há que se esclarecer que Exu zela por valores éticos e reconhece o poder de melhoramento dos seres humanos. Todavia, apoia e favorece as mudanças pessoais, indispensáveis à prática de virtudes que alicerçam o bom caráter. Quando isso está ausente, Exu não aprecia e não apoia, pois a indisciplina e a desorganização não fazem parte de sua ação. Ao contrário, ele retifica, faz a sombra vir à tona para o indivíduo se aprumar, mesmo que aparentemente isso possa parecer maldoso, pois Exu, acima de tudo, é justo, doa a quem doer. Ele é o mensageiro atemporal, em sincronicidade transita em nosso passado, influenciando o presente, para termos um aqui e agora melhor e uma boa colheita no futuro. 

 Exu é nosso cúmplice, amigo fiel, quando estamos esforçando-nos para melhorarmos intimamente. Em contrário, fantasias mirabo­lantes, aspirações de soluções mágicas sem esforço individual, desejo ardiloso de ganho fácil se aproveitando da inocência dos outros, isso tudo não atrai a ação cósmica de Exu, afastando-o. O compromisso e a responsabilidade que cada um deve ter, para consigo mesmo, passa por um comportamento adequado, mínimo, no campo da ética que orienta a ação de Exu.

Então, Exu é o Senhor Valoroso – Tiriri – que abre os nossos caminhos. Abre-os para o fortalecimento do caráter através da caminhada interna de superação de nosso lado sombra, para ­vencermos nossas negatividades. Apoia o impulso de nossa vontade, que nos conduz ao esforço pessoal, indispensável para percorremos os caminhos indicados por ele. Cabe somente a nós darmos os passos necessários à superação dos obstáculos inerentes à natureza humana.



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